sexta-feira, 8 de abril de 2011

Três dias em São Paulo

Hoje eu escrevo sobre um pouco da vida fora do campo.

A idéia nua e crua de ir passar alguns dias em São Paulo frequentemente seduz qualquer um que seja apaixonado por cultura e que não more naquela cidade. O poder de imaginação sobre o que alguns dias em São Paulo podem fazer com você é grande e tende a idealizar uma cidade receptiva a o que você tem a oferecer a ela, e solidária em retribuir com tudo o que há de melhor. Afinal, lá é o lugar onde tudo o que há de melhor – em matérias que não envolvem a natureza – está, no Brasil. Ou assim se crê.

A primeira grande desilusão está em perceber que a viagem de carro normalmente é muito mais estressante e cara do que se imagina. O que para você poderia evocar um passeio agradável, ao som que você escolher, a caminho do paraíso urbano, não passa de uma rotina tediosa para a maioria dos motoristas a sua volta. Nenhum deles está interessado em saber que você mora no campo e está indo passar alguns dias agradáveis de cultura e sociedade. Para eles aquela cidade não passa de um lugar detestável, para onde eles só se dirigem diariamente por ser o único lugar onde poderiam encontrar um emprego que lhes pagassem o que consideram merecido, por suas horas insanas de trabalho no escritório frio e sóbrio, em meio ao som de carros, ônibus e sirenes que passam na avenida abaixo da janela da frente. Além disso, você se assusta a cada vez que se depara com um pedágio há 2 km, e cujo preço não era bem esse da última vez que você passou. Só em dinheiro para o pedágio, na ida e na volta, você já gastou duas entradas de cinema, uma de teatro ou um delicioso jantar no La Tartine.

Então, lembrando de sua última ida a São Paulo, e de suas surpresas na estrada, você decide ir de ônibus. Afinal, mesmo com uma linha de metrôs absolutamente ridícula quando comparada a qualquer cidade digna européia, ou a Manhattan, São Paulo ainda tem uma razoável rede de transporte público, que te permite circular pela pequena parte ao redor da Avenida Paulista, e pelo centro – que no fim e ao cabo, são os locias por onde você vai circular – além de contar com uma grande frota de táxis.

Antes de sair de casa você se imagina no ônibus. Nada melhor do que não ter que se preocupar com o trânsito. E você ainda pode ir lendo um bom livro enquanto seu corpo – quase sem que você perceba – se encaimnha para a admirável vida cultural paulistana. Ou ainda, se sua semana foi agitada, você vai dormindo e chega lá como num passe de mágica.

Pois então você chega na rodoviária e se lembra de que, é, você percebe que nem tudo é tão delicioso assim quando se trata de ir de ônibus. Você compra sua passagem e esquece de solicitar uma vaga no corredor. Só se lembra disso no momento de pisar no ônibus e percebe que sua vaga é na janela, ao lado de um grande cidadão que ocupa mais do que seu próprio acento. Na verdade ele não precisa ser tão grande assim. Os acentos é que foram feitos para pequenas moças que se dirigem para um concurso numa agência de modelos. Você se lembra de sua incontrolável claustrofobia e felizmente encontra outro local vazio para se sentar, no corredor, sem ninguém para perturbar sua agradável leitura.

Feliz com a situação que – você se ilude – “até que tem seu charme”, você saca seu livro da bolsa antes mesmo do motorista dar a partida. Dez minutos depois o ônibus já está na saída da cidade e você começa a se perguntar por que deixou seu sobretudo de lã, suas luvas, gorros e cachecóis em casa. Afinal, o termômetro do ar-condicionado do ônibus marca incríveis 15 graus, em pleno abril. Pois bem, você se encolhe toda e se concentra na leitura, que ainda está muito interessante. Mais cinco minutos e você começa a se sentir enjoado, e lembra que não se dá bem com leitura e movimento. Além disso, fica tentando descobrir de onde vem esse cheiro falso de morango de algum suposto produto de limpeza. Irritado com sigo mesmo, e se perguntando por que não veio de carro que, afinal de contas, parceia tão mais prático – agora que você está preso nesse ônibus horrível – você olha para o teto do veículo e percebe que o filtro do ar-condicionado está visível, e que sua troca deve estar  com uns três anos de atraso.

A chegada em São Paulo já se mostra deseperadora: de repente eu me vejo na rodoviária do Tietê, com uma pequena – porém pesada – mala a tira colo, que poderia estar muito mais leve se eu fosse um pouco mais sensata na hora de sair de casa. Atravessar São Paulo de metrô pode ser uma tarefa tranquila, ou uma verdadeira saga dantesca. Tudo depende de que horário estamos falando. Pois bem, eu estava no meio do rush matinal.

Trinta minutos, dois metros, muito peso e sete reais em táxi para descer a Frei Caneca depois, eu chego na minha hospedagem, louca por um sofá e um pouco de ar calmo. Mais quinze minutos e eu estou de volta na Paulista, agora leve e feliz da vida, entrando verdadeiramente na São Paulo que eu queria.



As coisas boas de São Paulo: um café no viena da Livraria Cultura do Conjunto Nacional num clima intelecto-liberal (um misto de intelectuais com trabalhadores liberais em reuniões descontraídas ou no meio de uma edição de um vídeo no notebook). Um passeio no MASP gratuitamente só para matar a saudade do acervo permanente. Andar pela Paulista e descer a Augusta à noite, sem medo de ser feliz. Pegar um cinema em qualquer canto da Paulista, e poder ver um filme que você sabe que não vai passar em Campinas. Encontrar amigos queridos que nunca conseguem te visitar – afinal, sair de SP é inconcebível para eles. Chegar num lugar mais rápido de ônibus do que chegaria de carro, graças ao corredor. De repente encontrar paz em algum lugar que não parece dentro daquela bagunça.

Entretanto, depois de três dias intensos nessa cidade louca, o que me resta: dor de cabeça, muita dor nas costas, dor no pescoço; reflexões mil sobre como é que vinte milhões de pessoas aguentam viver nessa insanidade (pensando nos olhos vermelhos e inchados de todos os que pegaram metro comigo até a rodoviária na quinta à noite); um tanto de inteligência e sabedoria a mais, adquiridas nas palestras que, no entanto, poderiam ter sido ministradas no sossego do IFCH; e uma resolução de quem fica um ano mais velha: depois dos vinte e quatro, eu nunca mais passo perrengue! Já aprendi a não passar no Rio, agora SP também entrou para a lista das interdições. Não! Não. Não gosto de aventuras na floresta, caminhadas, trilhas, esforço físico além do normal, então também não gosto dele na cidade, na bagunça da poluição, no calor ou no frio, ou na chuva de SP. Não. Se tiver que ir para SP será de carro, fora da hora do rush, nem que eu tenha que esperar por duas horas numa padaria qualquer tomando um café, lendo um bom livro, ou escrevendo.

2 comentários:

Lena disse...

Adoro ler os textos que escreve no blog,
Concordo que a jornada a SP com certeza é mais proveitosa se feita com calma e sem stress. A cidade tem muito a oferecer....

Isabel Hargrave disse...

Oi Lena, que bom que você gosta de ler o que me agrada escrever. Ainda vou me entender com SP.

Beijos!